sábado, 20 de fevereiro de 2010

George Lois, o Edmundo da Propaganda

Geralmente a criação em propaganda pode ser dividida em duas fases: antes e depois da DDB. No final dos anos 1950, início dos 1960, a pequena Doyle, Dane & Bernbach americana fundou uma abordagem criativa diferenciada, um divisor de águas na qual a campanha da VW (Think small) representa seu melhor exemplo, peças que misturam discurso comercial com um apelo à inteligência do receptor, abordagens que fogem do lugar comum da “matéria prima de qualidade e o melhor valor para você”. Da DDB nasceram campanhas como as da Avis (We try harder) que estabeleceram personalidade para as marcas e serviram para que o Al Ries e o Jack Trout identificassem um conceito central do marketing moderno, o posicionamento. Ou seja, aquilo que foi desenvolvido de forma intuitiva no mundo da prática foi sistematizado pela teoria para uso geral a partir da década de 1970, até chegar a coisas como branding e tal. Enfim, eu tenho que fazer um post só sobre minha admiração pelo Bill Bernbach e o trabalho de sua agência, mas não cabe aqui.


Um dos profissionais que trabalharam na DDB bem no início de sua carreira e que depois saíram para construir sua própria agência e que é dono da reputação de enfant terrible (como se dizia bad boy há algumas décadas) é o George Lois. O livro The Mirror Makers, de Stephen Fox (minha edição é da Illini Books, 1997) conta um pouco da história desse diretor de arte que trabalhou na DDB e que mereceu o seguinte comentário do próprio Bill Bernbach: “A única coisa errada com você, George, é que sua mente está no saco”. De família grega, crescido no Bronx em uma vizinhança irlandesa, Lois estudou no Pratt Art Institute e saiu da DDB para fundar sua primeira agência em 1960, com Fred Papert e o redator Julian Koenig (que escreveu algumas das melhores peças da campanha da VW) a Papert, Koenig, Lois. Esta agência fez peças como a que mostro aí do lado, para a vodka Wolfschmidt, na qual a garrafa de vodka tenta seduzir um tomate dizendo que, juntos, eles podem fazer excelentes Bloody Marys (clique na peça para vê-la ampliada). Em outra peça, publicada uma semana depois, a mesma garrafa chega junto numa laranja e diz assim: “bonequinha, gostei de você. Você tem sabor. Eu vou fazê-la famosa. Me beije!”. No que a laranja responde: “quem era aquele tomate que eu vi contigo na semana passada?”.

Nas várias agências nas quais foi sócio, George Lois ficou famoso por sua abordagem não muito ortodoxa no ambiente de trabalho, no qual se relatam cenas de pugilato entre equipes de criação e profissionais mijando em lay-outs não aprovados. Várias acusações de desvio ético na apropriação de idéias alheias são relatadas, inclusive no verbete sobre ele na Wikipédia. Mas poucos profissionais mereceram tanta atenção e reverência na fundação de um estilo moderno de se desenvolver campanhas persuasivas. Lois também ficou (muito) famoso pela série de capas que criou para a revista Esquire, que recentemente mereceu uma exposição no MoMA, dentro daquele conceito que que o design editorial e a propaganda são formas específicas da cultura do século XX, fenômeno que James Twitchell vai chamar de AdCult.



Uma frase atribuída a Lois e relatada no livro de Fox fala da visão que certamente ainda impera no departamento criativo da propaganda sobre os clientes, normalmente chamados de “eles”, os mais viscerais adversários no sentido de dar vida a peças que desafiam o senso comum: “Eles nunca vão entender porque nós trabalhamos 14 horas por dia e eles nunca vão entender a liberdade que precisamos em nossa maneira de trabalhar. Eles não gostam da forma pela qual trabalhamos, a maneira que falamos, a maneira que nos vestimos. Eles não sabem nada sobre propaganda ou como a melhor propaganda é criada. Eles botam nosso negócio pra baixo”.

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Enquanto escrevo esse post lembro-me de quem me apresentou ao livro com o trabalho de George Lois, assim como a todas as peças da campanha da VW foi o meu querido amigo Anibal Guastavino, com quem tive o privilégio de formar dupla de criação e compartilhar a mesma mesa de trabalho por um ano e meio, mais ou menos. O Anibal foi uma grande influência na minha carreira e na forma como enxergo a propaganda e a comunicação de marketing. Ele (me) faz muita falta.

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